COMPETÊNCIAS CLÍNICAS A ADQUIRIR NOS ENSINOS CLÍNICOS: OPINIÃO DOS ALUNOS DA UNIVERSIDADE FERNANDO PESSOA
Trabajo Nº:RES0018
Tipo:Oral
Tema:Narrativas de estudiantes con reflexión sobre lo vivido y aprovechado de su experiencia en las prácticas
Autores: Fátima Santos
UFP-FCS-ESS (Fisioterapia)
fatimas@ufp.edu.pt


Claire Luquet
Prática privada (Fisioterapia)
claire.luquet06@laposte.net

Maria Conceição Manso
UFP-FCS ()
cmanso@ufp.edu.pt

Nuno Ventura
UFP-FCS-ESS (Fisioterapia)
nunov@ufp.edu.pt

Clarinda Festas
UFP-FCS-ESS (Fisioterapia)
clarinda@ufp.edu.pt
Keywords:Educação Clínica; opinião dos alunos; competências clínicas; Fisioterapia
INTRODUCCIÓN
Resumo

Introdução: a aquisição de competências-chave no âmbito da educação clínica é crucial para formar futuros profissionais de saúde. Assim, torna-se relevante promover a melhoria na aprendizagem dos alunos de Fisioterapia.
Objetivos: hierarquizar a ordem de importância das competências a adquirir pelos alunos de Fisioterapia em ensinos clínicos, sob a sua perspetiva, de acordo com o ano de curso e o respetivo ensino clínico.
Metodologia: questionário construído especificamente e disponibilizado via e-mail institucional para os alunos em Ensino Clínico na Clínica Pedagógica de Fisioterapia e no Hospital-Escola da UFP, perguntando-se os 8 critérios mais importantes e qual a ordem de importância de cada uma das competências [de 1 (mais importante) a 8 (menos importante)], para Conhecimentos, Desempenho técnico, Profissionalismo, Capacidades interpessoais, Raciocínio Clínico, Resolução de problemas, Organização e gestão de tempo e recursos, e Dossier/Relatórios, que um aluno deve adquirir nos ensinos clínicos. Foi organizado um ranking de competências para cada um de cinco Ensinos Clínicos. Comparações realizadas através de testes não-paramétricos (alfa=0,05).
Resultados: obtiveram-se 99 respostas ao questionário num total de 354 alunos inscritos (2ºano n=105, 3ºano n=138; 4ºano n=111). A maioria dos participantes era do sexo feminino (68,9%), todos com idade entre os 18 e 24 anos. Responderam 20,7% dos alunos ao Estágio Profissionalizante II (4ºano), 18,8%% ao Estágio Profissionalizante I, 11,6% à Clínica Integrada em Fisioterapia e 10,9% ao Ensino Clínico II (3ºano) e 18,1% a Ensino Clínico I (2ºano).
Conclusões: As competências principais, identificadas como mais importantes pelos alunos da licenciatura de fisioterapia da UFP foram, os Conhecimentos e o Desempenho Técnico, em todos os ensinos clínicos de todos os anos. Nos dois Ensinos Clínicos finais, de EPI de 3º e EPII do 4ºano, adicionam-se ainda o Profissionalismo (competência principal) e o Raciocínio Clínico. As competências-chave menos valorizadas no fim do percurso académico (4º ano) são as Capacidades Interpessoais, a Organização e Gestão de Tempo e Recursos e ainda Dossier/Relatórios.
 

1. INTRODUÇÃO

 

A aquisição de competências-chave no âmbito da educação clínica é crucial para formar futuros profissionais de saúde. Assim, torna-se relevante promover a melhoria na aprendizagem dos alunos de Fisioterapia.

Para preparar de forma consistente os alunos de Fisioterapia para o início dos ensinos clínicos, o curriculum do curso deve fornecer e avaliar competências no que respeita a conhecimento básico, capacidades técnicas, atitudes e comportamentos profissionais (Timmerberg et al., 2019).

A educação clínica permite o desenvolvimento de competências clínicas, teóricas e profissionais dos alunos antes de começar a actividade profissional, sendo o objetivo principal da aprendizagem habilitar os alunos para as competências clínicas e práticas de maneira a progredir de forma evolutiva ao longo do curso (Lekkas et al., 2007). A educação clínica deve permitir uma prática engloba uma prática onde haja a aquisição de competências profissionais essenciais em contexto real com pacientes (Viana et al., 2012).

A educação clínica é uma componente fundamental durante a formação académica que leva a um adequado desenvolvimento de competências profissionais (Strohschein, Hagler & May, 2002).

Jette e Portney (2003) defendem existir sete competências-chave a desenvolver pelos alunos de Fisioterapia em educação clínica: conhecimento, competências clínicas (desempenho técnico), segurança/confiança (processo de tomada de decisão, na prática e nas técnicas usadas), processo de decisão clínica, auto-aprendizagem, comunicação interpessoal e comportamento profissional. Outros autores, como Smith, Dollase e Boss (2003), definem critérios-chave análogas que um aluno tem que atingir nos ensinos clínicos, nomeadamente: a comunicação; as competências clínicas básicas; as competências baseadas na evidência; capacidade de diagnóstico, gestão e prevenção; aprendizagem ao longo da vida; o crescimento pessoal; contextos social e populacional na área da saúde (capacidade de responder aos fatores que influenciam a saúde e a doença: sociocultural, familiar, psicológico, entre outros); raciocínio moral e ética clínica; resolução de problemas.

No estudo de Joseph, Hendricks e Frantz (2011), segundo a opinião dos supervisores foram definidos 8 critérios que correspondem às competências-chave da avaliação de alunos de Fisioterapia: Conhecimento, Comunicação, Profissionalismo, Planeamento, Raciocínio Clínico, Gestão do paciente, Capacidade de Reflexão e Gestão e organização do tempo. Esse último modelo é o que corresponde mais ao utilizado no curso Fisioterapia da Universidade Fernando Pessoa, sendo que os alunos têm educação clínica no segundo, terceiro e quarto ano do curso (segundo ano: Ensino Clínico I; terceiro ano: Ensino Clínico II no primeiro semestre e Clínica Integrada e Estágio Profissionalizante I no segundo semestre; quarto ano: Estágio Profissionalizante II).

Dado que parece não existir consenso entre os autores sobre a importância dos itens de avaliação dos alunos em educação clínica, foi objetivo deste estudo identificar e hierarquizar a ordem de importância das competências a adquirir pelos alunos em ensinos clínicos, sob a perspetiva dos alunos, e descrevê-las de acordo com o ano de curso e o respetivo ensino clínico.

METODOLOGÍA
  1. METODOLOGIA

Foi realizado um estudo de caráter observacional, descritivo e transversal, com recurso a um questionário on-line, construído para o efeito.

2.1. PARTICIPANTES

Amostra não-probabilística. Foram estudados os alunos que frequentavamas unidades curriculares de Educação Clínica do segundo, terceiro e quarto ano da Licenciatura de Fisioterapia da Universidade Fernando Pessoa (UFP), no ano letivo 2016-2017.

2.2. INSTRUMENTOS

Foi realizado um questionário on-line aos alunos do segundo, terceiro e quarto ano da Licenciatura de Fisioterapia da UFP que frequentassem as  unidades curriculares da Educação Clínica de modo a aferir quais os critérios/competências mais importantes a desenvolver nos alunos de Fisioterapia do segundo, terceiro e quarto ano, hierarquizando-os pela ordem de importância percebida pelos alunos.

2.3. RECOLHA DE DADOS E PROCEDIMENTOS

O estudo teve parecer positivo pela Comissão de Ética da Universidade Fernando Pessoa. Os participantes deram o seu consentimento/assentimento informado após o conhecimento do estudo de acordo com a Declaração de Helsínquia, antes do preenchimento do questionário. Cada questionário foi preenchido de forma anónima e as informações recolhidas foram analisadas garantindo o anonimato e a confidencialidade dos participantes.

O link/caminho do questionário on-line foi enviado aos alunos através do e-mail institucional da Universidade Fernando Pessoa. A primeira parte do questionário corresponde à caracterização dos participantes e a segunda parte corresponde à identificação e classificação dos critérios/competências de avaliação dos alunos: A cada participante foi pedido para enumerar e classificar por ordem de importância (1: mais importante a 8: menos importante) oito critérios relacionados com as competências clínicas que os alunos percecionam que devem demonstrar durante as unidades curriculares de Educação Clínica. Os participantes tiveram de responder em função da(s) unidade(s) curricular(s) que frequentavam.

As respostas ao questionário foram posteriormente transferidas e analisadas no Software IBM© SPSS© Statistics versão 24.0.

A análise descritiva dos resultados competências-chave mencionadas pelos alunos como sendo pelo menos bastante importantes (soma de número de respostas com classificação “1-mais importante”, “2-muito importante” e “3-bastante importante”) foi realizada através de contagens e respetivas percentagens (%) (na tabela 1). Nesta amostra, o ranking de competências-chave para cada um de cinco Ensinos Clínicos foi criado pela média (ranking médio) das respostas [de 1 (mais importante) a 8 (menos importante)] e essa média ordenada do menor valor, correspondendo ao ranking 1 – competência mais importante, ao maior valor, correspondendo ao ranking 8 – competência menos importante. Posteriormente, foi realizada inferência estatística para comparar, na população representada por esta amostra, e em cada ensino clínico, o grau de importância das competências-chave, através de teste não‑paramétrico emparelhado de Friedman. Tendo sido detetadas diferenças significativas estas foram identificadas com recurso ao teste de Wilcoxon com correção de Bonferroni de forma a manter 95% de confiança (nas tabelas 2 e 3). Todas as comparações foram realizadas com um nível de significância de 0,05.

RESULTADOS
  1. RESULTADOS/DISCUSSÃO

Os participantes eram na sua maioria do sexo feminino (68,9%), com idades compreendidas entre os 18 e 24 anos. Responderam 20,7% dos alunos, ao Estágio Profissionalizante II (4ºano), 18,8% ao Estágio Profissionalizante I, 11,6% à Clínica Integrada em Fisioterapia e 10,9% ao Ensino Clínico II (3º ano) e 18,1% ao Ensino Clínico I (2º ano).

Da análise das respostas foram criadas 8 categorias principais: Conhecimentos, Desempenho técnico, Profissionalismo, Capacidades Interpessoais, Raciocínio Clínico, Resolução de Problemas, Organização e Gestão de Recursos e Tempo, e Dossier. Estas 8 categorias têm uma frequência variável em função da Unidade Curricular. Encontramos, de forma geral, os mesmos critérios de avaliação que constam na grelha de avaliação da UFP. Os critérios respondidos pelos participantes encontram-se na Tabela 1.

Na análise global por Ensino Clínico (Tabela 1), verificamos que a competência-chave Conhecimentos foi mencionada como “pelo menos bastante importante” no Ensino Clínico I (ECI) por todos os participantes (100%), e numa percentagem igual ou superior a 80% no Ensino Clínico II (ECII), Clínica Integrada em Fisioterapia (CIF) e Estágio Profissionalizante II (EPI). O Desempenho Técnico foi referido por cerca de 80% participantes no Ensino Clínico II e Estágio Profissionalizante I.

As competências-chave menos referidas neste contexto (Tabela 1) foram a Organização e Gestão de Tempo e Recursos para o Ensino Clínico I, Ensino Clínico II e Estágio Profissionalizante II, e o Dossier/Relatório para unidades curriculares a partir do 3º ano (Ensino Clínico II, Clínica Integrada em Fisioterapia, Estágio Profissionalizante I, Estágio Profissionalizante II). A Resolução de Problemas também não foi valorizada como “pelo menos bastante importante” no contexto dos ensinos clínicos de início de curso (Ensino Clínico I e Ensino Clínico II).

 

Na Tabela 2 pode verificar-se que há diferenças significativas no grau de importância atribuída a algumas das competências-chave em todos os ensinos clínicos (p<0,001 nos 5 ensinos clínicos). No Ensino Clínico I, as competências-chave identificadas como mais importantes foram Conhecimentos, Capacidades Interpessoais e Desempenho Técnico, cuja valorização não difere significativamente entre si (p>0,05 nas várias comparações). As competências com valorização imediatamente seguinte (grau de importância significativamente inferior às 3 referidas anteriormente; p<0,05) foram o Raciocínio Clínico, Organização e Gestão de Tempo e Recursos e Dossier/Relatórios que também não se diferenciam significativamente entre si (p>0,05). O Profissionalismo é uma competência-chave cuja valorização não difere significativamente das identificadas nos dois grupos/ordem anteriores (p>0,05). Por fim, e identificada como significativamente menos importante de todas as competências (p<0,05 para todas as comparações), foi a Resolução de Problemas. Assim, e apesar de nesta amostra se identificar uma ordenação (ranking) de 1 a 8, do ponto de vista estatístico, inferindo para a população de alunos, as competências-chave Conhecimentos, as Capacidades interpessoais e o Desempenho técnico apresentam um grau de importância não diferenciado e, portanto, são igualmente percebidas com ranking mais elevado (identificado com a letra A). De seguida, e também não se diferenciando entre si, estão as competências-chave Raciocínio Clínico, Organização e gestão de tempo e recursos e ainda Dossier/relatórios, com um nível de ranking intermédio (identificado com a letra B). A competência-chave Profissionalismo está num ranking não diferenciável nem do primeiro nível nem do segundo (pelo que é identificado com as letras AB). Por fim, e diferenciando-se de todas as outras competências, aparece a Resolução de Problemas com menor ranking de importância percebida (identificado com a letra C).

No Ensino Clínico II, as competências igualmente mais relevantes foram Conhecimentos e Desempenho Técnico enquanto que as menos importantes foram o Dossier/Relatório e Resolução de Problemas. Inferindo para a população de alunos, as competências-chave Conhecimentos e o Desempenho técnico apresentam um grau de importância não diferenciado e, são igualmente percebidas com ranking mais elevado (identificado com a letra A). De seguida, aparece a competência-chave Organização e gestão de tempo e recursos com um ranking intermédio de importância (identificado com a letra B). As competência-chave Profissionalismo, Capacidades Interpessoais e o Raciocínio Clínico estão num ranking não diferenciável nem do primeiro nível nem do segundo (pelo que são identificadas com as letras AB). Por fim, e diferenciando-se de todas as outras competências, aparecem o Dossier/relatórios e a Resolução de Problemas com menor ranking de importância percebida (identificado com a letra C).

No Clínica Integrada em Fisioterapia, as competências-chave igualmente valorizadas foram Conhecimentos e Desempenho Técnico enquanto que a menos importante foi o Dossier/Relatório. Inferindo para a população de alunos, a distribuição encontrada é muito semelhante à detetada no Ensino Clinico II, nomeadamente nas competências-chave do grupo de ranking mais elevado (A):   Conhecimentos e o Desempenho técnico; De seguida, e ligeiramente diferente do detetado na unidade curricular anteriormente mencionada, aparecem as competências-chave Resolução de Problemas e a Organização e Gestão de Tempo e Recursos com um ranking intermédio de importância (identificado com a letra B). Novamente, também as competência-chave Profissionalismo, Capacidades interpessoais e o Raciocínio Clínico estão num ranking não diferenciável nem do primeiro nível nem do segundo (pelo que são identificadas com as letras AB). Por fim, e diferenciando-se de todas as outras competências, aparece o Dossier/relatórios com menor ranking de importância percebida (identificado com a letra C).

Quanto ao Estágio Profissionalizante I, as competências-chave mais importantes foram Conhecimentos, Desempenho Técnico, Profissionalismo e Raciocínio Clínico, igualmente valorizadas (identificadas com a letra A), enquanto as menos, mas igualmente valorizadas, foram Resolução de Problemas, Capacidades Interpessoais, Organização e Gestão de Tempo e Recursos e o Dossier/Relatório (identificadas com a letra B).

Por último, no Estágio Profissionalizante II, volta a existir uma maior diferenciação na perceção de importância. As competências-chave identificadas como mais importantes e igualmente valorizadas foram Conhecimentos, Desempenho Técnico, Profissionalismo e Raciocínio Clínico (identificadas com a letra A), seguido da competência Resolução de problemas (identificadas com a letra B), e as menos importantes, mas com ranking estatisticamente não diferenciável, foram as Capacidades Interpessoais, a Organização e Gestão de Tempo e Recursos e o Dossier/Relatório (identificadas com a letra C).

 

 

Numa análise ao longo da progressão por ensinos clínicos do curso (Tabela 2), observamos que os Conhecimentos representam a competência mais importante a adquirir pelos alunos, durante a formação clínica, exceto no Estágio Profissionalizante II, em que esta precedida pelo Profissionalismo. Estes resultados contrariam os do estudo de Gilliland e Wainwright (2017), em que as autoras pretenderam analisar, através de uma metodologia qualitativa, a forma com os alunos de fisioterapia conceptualizavam a prática da fisioterapia, tendo efetuado para isso, entrevistas semiestruturadas. Por outro, as autoras pretenderam perceber igualmente qual a perceção dos alunos sobre o grau de importância dada a vários componentes da prática, através de uma metodologia Q-SORT modificada. Os componentes analisados eram : 1) Testar o comprometimento de tecidos/estruturas (testes específicos, identificar a patologia); 2) testar nível de incapacidades (amplitude de movimento, teste muscular manual, teste de extensibilidade muscular); 3) testar o nível de atividade (testar “sit to stand”, marcha, atividades funcionais); 4) avaliar o estado funcional atual do paciente (capacidade em participar em atividades no domicílio, no trabalho e atividades de lazer); 5) Observar a postura do paciente (posição estática de todo o corpo ou dos segmentos corporais); 6) avaliar o nível de dor do paciente; 7) conhecimento sobre o emprego do paciente e atividades de lazer (o que o paciente faz no trabalho, em atividades de lazer); 8) conhecimento do nível de suporte social do paciente); 9) compreensão do estado psicológico/emocional do paciente); 10) conhecimento sobre as expetativas do paciente em relação à fisioterapia. Nesse sentido, foi pedido aos alunos que selecionassem os três parâmetros que estes acreditavam ser os “mais importantes” na sua intervenção com o paciente, assim com os que consideravam ser os “menos importantes”.

Gilliland e Wainwright (2017) utilizaram um guião de entrevista baseado em guiões similares anteriormente utilizados em estudos que visaram explorar a compreensão de alunos e profissionais sobre a prática médica, assim como a perceção de fisioterapeutas recém-formados sobre a prática clínica, uma vez que a literatura é escassa nesta área. Assim, no seu estudo, estas autoras visaram explorar a forma como os alunos de fisioterapia de duas universidades conceptualizavam a prática clínica, ou seja, o ensino clínico ao longo do curso. Desta forma, todos os alunos do segundo ano dessas universidades foram convidados a participar no estudo, durante o final do segundo ano. Participaram no estudo oito alunos de fisioterapia, selecionados de forma randomizada dos que se voluntariaram inicialmente das duas universidades e que apresentavam características demográficas semelhantes. Da análise e interpretação do discurso dos alunos de fisioterapia sugiram quatro categorias para conceptualizar a prática de fisioterapia: 1) “Diagnosticar e resolver problemas”; 2) “Avaliar e educar o paciente”; 3) “Dar suporte ao paciente enquanto se diagnostica e trata”; 4) “Trabalhar com o paciente”, contudo as autoras constataram que os alunos valorizaram em primeiro lugar o seu conhecimento e esperam que o paciente aprenda o que lhe é ensinado. De uma forma geral, os alunos conceptualizaram a prática da fisioterapia como um meio de restaurar as capacidades físicas e funcionais do paciente. Assim, Gilliland e Wainwright (2017) identificaram, nas respostas dos alunos, um foco mecanicista quanto à prática da fisioterapia, o que pode resultar não só de competências limitadas, mas também na incapacidade de uma prática centrada no paciente, que é característica de fisioterapeutas especialistas. A maioria dos alunos identificou de limitada importância as expectativas dos pacientes quanto à fisioterapia como fator que influencia a elaboração do plano de tratamento, o que sugere, segundo as autoras, um conhecimento limitado sobre o valor que este parâmetro tem na obtenção de resultados terapêuticos. Por outro lado, a sobrevalorização que os alunos atribuíram à função física (competência-chave: Desempenho Técnico), isolada dos papéis psicossociais do paciente, pode limitar a sua eficácia na prática clínica e no crescimento profissional. Ao contrário dos resultados da investigação de Gilliland e Wainwright (2017), no nosso estudo, o Profissionalismo foi a competência-chave mais importante dos alunos no Estágio Profissionalizante II (último Ensino Clínico do curso), o que sugere que os alunos da UFP valorizam, além do “saber fazer” (Desempenho técnico), o “saber estar”, i.e., valorizando o Outro (paciente) e as suas expectativas. No entanto, no presente estudo, os resultados sobre o grau de importância que os alunos atribuíram aos diferentes parâmetros (Conhecimentos, Desempenho Técnico, Profissionalismo, Capacidades Interpessoais, Raciocínio Clínico, Resolução de Problemas, Organização e Gestão de Tempo e Recursos, e Dossier/Relatórios) foram obtidos através das respostas a um questionário que continha unicamente perguntas fechadas, o que impossibilitava os alunos de fisioterapia da Universidade Fernando Pessoa de tecer considerações mais aprofundadas sobre o tema analisado.

A segunda competência que esta amostra de alunos considera mais importante adquirir durante o curso variou ao longo do percurso académico, sendo que no ECI (alunos do 2º ano) mencionaram as Capacidades Interpessoais, os do Ensino Clínico II, Clínica Integrada em Fisioterapia e Estágio Profissionalizante I (alunos do 3º ano) o Desempenho Técnico e os de Estágio Profissionalizante II (4º ano), os Conhecimentos. De referir que, no nosso estudo, as Capacidades Interpessoais, vão diminuindo em grau de importância ao longo dos diferentes anos, o que poderá indicar uma tendência para os alunos de fisioterapia da UFP não valorizarem esta competência-chave à medida que se aproximam do final do curso. 

Contudo, no estudo já citado anteriormente, Gilliland e Wainwright (2017) apontam investigações onde se verificou que os fisioterapeutas recém-formados preocupam-se mais com a sua própria performance e competências hand-on enquanto que, para fisioterapeutas especialistas, as competências técnicas formam a base para envolver os pacientes no seu auto-cuidado. Tal significa que, como nos estudos mencionados por Gilliland e Wainwright (2017), em que os fisioterapeutas recém-formados preocupam-se mais com o seu próprio desempenho, também no presente estudo verifica-se a tendência para os alunos de fisioterapia não valorizarem a competência Capacidades Interpessoais, ou seja a capacidade de relacionamento com os Outros (pacientes, supervisores, outros profissionais) à medida que se aproximam do final do curso. Este facto poderá ser importante para informar os professores, coordenadores e diretores responsáveis pelos curricula do Curso de Fisioterapia da UFP, da necessidade de intensificar o foco da sua formação, ao longo do curso, no desenvolvimento desta competência. De salientar que, a European Network of Physiotherapy in Higher Education (ENPHE) preconiza, atualmente, a promoção da reflexão pessoal do aluno, intimamente relacionado com as suas capacidades interpessoais, como um dos fatores a ser estimulado no processo de ensino/aprendizagem, mudando o paradigma do Ensino Superior em Fisioterapia para um Modelo de Aprendizagem Centrada no Aluno.

Ao longo dos diferentes anos em que os alunos realizam Ensinos Clínicos, verifica-se que o Profissionalismo vai subindo gradualmente de posição, assumindo-se como a competência‑chave mais importante no último ano de curso (Estágio Profissionalizante II). Estes resultados assemelham-se aos obtidos no estudo realizado por Wormley, Tovin, Lusardi & Wilson (2018), cujo objetivo foi compreender, interpretar e descrever as perspetivas dos alunos a frequentar o programa doutoral em fisioterapia[1] sobre o desenvolvimento das competências-chave. Nesse estudo, foram criados grupos focais nos quais 27 dos 49 alunos da mesma turma foram entrevistados de modo a entender as suas experiências, no final da sua graduação, antes de entrar na vida profissional. Tal como no nosso estudo, em que os alunos no último ano apontaram o Profissionalismo como a competência-chave mais importante, também o estudo de Wormley, Tovin, Lusardi & Wilson (2018) revela o valor que os alunos de fisioterapia atribuem ao profissionalismo, no momento anterior ao início do seu percurso/actividade profissional. Os autores deste estudo salientam que a reflexão dos alunos de como o profissionalismo evolui durante a progressão da sua vida académica é uma informação valiosa para os educadores/professores. A compreensão das experiências curriculares que contribuam para o processo de “tornar-se profissional” pode informar o desenvolvimento curricular à medida que os professores planeiam experiências de aprendizagem específicas.

Por outro lado, também o estudo efetuado Timmerberg et al. (2019) a supervisores clínicos, fisioterapeutas recém-formados, directores/coordenadores académicos de educação clínica e docentes de fisioterapia, mostra a mesma tendência. Nesse estudo, tendo por base um estudo Dephi, o objetivo foi desenvolver um consenso sobre um core set de elementos que devem ser demonstrados por alunos de fisioterapia antes de começar a sua experiência clínica em tempo integral. Na análise de resultados, verificou-se que aspetos relacionados com o profissionalismo (demonstrar comportamentos adequados; apresentar-se devidamente à equipa multiprofissional e pacientes; respeito pelos pacientes, colegas, outros profissionais e comunidade; pontualidade com todos os trabalhos, farda apropriada) tiveram um consenso ≥ 80 % dos participantes em relação a uma performance proficiente, dando grande importância à precocidade do ensino da proficiência em comportamentos afetivos, mais do que o conhecimento e habilidades psicomotoras, antes de iniciar o ensino clínico a tempo integral (Timmerberg et al., 2019) que, no caso dos alunos da UFP, se inicia no Estágio Profissionalizante I (EPI).

Por ano de curso (Tabela 3), a ordenação de importância atribuída às competências-chave no 2ºano é semelhante à descrita anteriormente para ECI e as do 4ºano semelhantes à de Estágio Profissionalizante II (EPII), mas relativamente ao 3º ano, e agrupando a informação dos 3 ensinos clínicos (Ensino Clínico II, Clínica Integrada em Fisioterapia e Estágio Profissionalizante I) num único grupo, é possível concluir que também há diferenças significativas (p<0,001). Assim, esta inferência para a população de alunos de 3º ano permite detetar 3 grupos homogéneos de competências-chave e um grupo que se sobrepõe: as quatro competências-chave de ranking igualmente mais elevado (A) são os Conhecimentos, o Desempenho técnico, o Profissionalismo e o Raciocínio Clínico; De seguida, aparece sozinha a competência-chave Capacidades interpessoais (identificada com a letra B). Resolução de Problemas e a Organização e Gestão de Tempo e Recursos estão num ranking não diferenciável nem do primeiro nem do segundo nível (pelo que são identificadas com as letras AB). Por fim, diferenciando-se de todas as outras competências, aparece a competência-chave Dossier/relatórios com menor ranking de importância percebida (identificado com a letra C).

Assim, para os alunos de 3º ano e 4º ano, há quatro competências-chave igualmente mais valorizadas: Conhecimentos, Desempenho Técnico, Profissionalismo e Raciocínio Clínico (não diferindo significativamente entre si, p>0,05), o que significa que nos últimos ensinos clínicos do curso, os alunos valorizam o “saber” (Conhecimentos), o “saber fazer” (Desempenho Técnico e Raciocínio Clínico) e o “saber estar” (Profissionalismo), três pilares fundamentais para o exercício profissional de Fisioterapia. De uma forma semelhante, Willis el al (2018) relatam que os docentes de fisioterapia consideram o raciocínio clínico como um domínio de aprendizagem fundamental e uma competência chave para fisioterapeutas recém-formados.

As Capacidades Interpessoais são referidas com intermediamente importantes no 3º ano (diferem significativamente do grupo anterior e também de Dossier/Relatório) enquanto o Dossier/relatório é referido como a competência menos importante pelos alunos no 3ºano.

 

 

 

No nosso estudo, as competências interpessoais, ou seja, o saber ser (Capacidades Interpessoais) só são consideradas dentro das mais importantes pelos alunos no 2º ano diminuindo a ordem de importância ao longo do curso (Tabela 3), o que nos leva a considerar a necessidade de, no curriculum académico dos alunos de Fisioterapia da Universidade Fernando Pessoa, existir o aprofundamento desta temática nos últimos dois anos de curso.

Estes dados contrariam os do estudo de Strohschein et al (2002), em que os autores procuraram identificar as áreas de mudança do ensino clínico em fisioterapia, tendo concluído que as áreas não técnicas, como a comunicação, a colaboração e a capacidade de reflexão são cruciais para uma prática clínica efetiva. Também Silberman et al (2018) apontam investigações que sugerem que uma comunicação eficaz e um bom relacionamento interpessoal fazem parte das competências chave para os alunos de fisioterapia obterem sucesso, apesar destas não serem necessariamente preditivas para o desempenho clínico.

Ainda sobre o tema, Mintz e Stoller(2014), na sua revisão sistemática sobre liderança médica e inteligência emocional, concluiram que esta última é fundamental na formação dos profissionais de saúde. Contudo, apesar de se ter verificado, no nosso estudo, uma tendência para diminuição na valorização das Competências Interpessoais, ao longo do curso, constata-se por outro lado, uma maior importância dada ao Profissionalismo, que engloba implicitamente uma capacidade para estabelecer uma boa relação interpessoal.

O Dossier/relatório é referido pelos alunos de fisioterapia, ao longo do curso, como uma das competências-chave menos importantes, o que também foi verificado no estudo de Joseph et al. (2011),em que a gestão de tempo foi assinalada como a menos importante.

 

[1] De realçar que, nos EUA, o grau de Doutor em Fisioterapia (Doutoramento profissional) é pré-requisito/qualificação para início do percurso profissional enquanto em Portugal, como noutros países do mundo, o pré-requisito para início do percurso profissional é a licenciatura.

CONCLUSIONES

As competências principais, identificadas como mais importantes pelos alunos da licenciatura de fisioterapia da UFP são os Conhecimentos e o Desempenho Técnico, em todos os ensinos clínicos de todos os anos. Nos dois Ensinos Clínicos finais, de Estágio Profissionalizante I de 3º e Estágio Profissionalizante II do 4ºano, adicionam-se ainda o Profissionalismo (competência principal) e o Raciocínio Clínico. As competências-chave menos valorizadas no fim do percurso académico (4º ano) são as Capacidades Interpessoais, a Organização e Gestão de Tempo e Recursos e ainda Dossier/Relatórios.

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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